É
dever dos entes públicos custear o tratamento de saúde aos que necessitam. Esse
foi o entendimento da 6ª Turma do Tribunal Regional da 3ª Região ao manter
decisão que condenou a União ao fornecimento de um medicamento não registrado
pela Anvisa no Brasil.
Fornecer
atendimento médico e remédios é dever constitucional do Estado, diz decisão.
O
caso é o de uma criança de 7 anos portadora de Distrofia Muscular de Duchenne —
doença genética degenerativa que atinge a musculatura esquelética comprometendo
força e movimentos — que precisa tomar o medicamento Translarna (Ataluren) para
tratar a doença, conforme prescrito em relatório médico.
No
recurso interposto no TRF-3, a União sustentou a ocorrência de violação da
eficácia vinculante de julgado do Superior Tribunal de Justiça no REsp
repetitivo 1.657.156 (Tema 106), que diz ser exigido, entre outros requisitos,
o registro do medicamento na Anvisa para que ele possa concedido por ordem
judicial.
Urgência
e gravidade
No
entanto, para o relator do caso, desembargador Johonsom Di Salvo, o fato do
medicamento não estar aprovado pela Anvisa não proíbe o seu uso no tratamento
da criança. Ele ressaltou que o remédio foi aprovado para uso e comercialização
em mais de 31 países, depois de obter registro na Agência Europeia de
Medicamentos (EMA).
Para
Di Silva, apesar da discussão do Tema 106 no STJ sobre se o Poder Público está
ou não adstrito a fornecer medicamento de alto custo não aprovado ainda pela
Anvisa, a questão está aberta no Supremo Tribunal Federal, por se cuidar de
matéria constitucional. Logo, disse, sobre o repetitivo, caberia apenas identificar
se o medicamento é comprovado para o tratamento pretendido e se a parte teria
capacidade financeira para suportar o tratamento.
Para
o relator do caso, a gravidade da doença, que pode matar ao longo dos anos, e a
urgência da demanda do autor, envolve o direito à saúde, que é cuidado como
matéria constitucional pelo Supremo. Di Salvo destacou que fornecer atendimento
médico e remédios é dever constitucional do Estado. “O preceito do artigo 196
da Constituição Federal assegura aos menos afortunados o fornecimento, pelo
Estado, dos medicamentos necessários ao restabelecimento da saúde", disse
apontando para a jurisprudência do STF no mesmo sentindo.
O
relator acrescentou que a corte tem orientado ser possível ao Judiciário a
determinação de fornecimento de medicamento não incluído na lista padronizada
fornecida pelo Sistema Único de Saúde (SUS), desde que reste comprovação de que
não exista outra opção de tratamento eficaz para a enfermidade.
Na
decisão, o desembargador ressaltou que o medicamento é o ideal para tratamento
e que há prova suficiente, conforme laudo médico da neurologista pediátrica
descrevendo com detalhes a situação da criança e os potenciais agravamentos que
podem levá-lo até mesmo a morte se não se adotar o tratamento reclamado. “O SUS
fornece apenas paliativos para a doença, e ainda assim somente em alguns
estados da Federação”.
Quanto
ao custeio, destacou que se trata de medicamento com preço muito além do
patrimônio de qualquer brasileiro comum. Explica que o pai da criança tem
apenas o curso fundamental incompleto e trabalha como sushi-man e não se sabe
onde poderia arranjar quase R$ 2 milhões para o tratamento.
Ao
indeferir o pedido de efeito suspensivo da União, o desembargador disse, ainda,
que era relevante e plausível a concessão da medicação à criança de 7 anos,
pois se tratava de indivíduo vulnerável, conforme preconiza o artigo 7º, do
Estatuto da Criança e Adolescente (ECA).
“A
criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a
efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o
desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência”,
concluiu.
Com informações da
Assessoria de Imprensa do TRF-3.
Agravo de Instrumento
5004419-89.2019.4.03.0000
Revista Consultor
Jurídico
https://www.conjur.com.br/2019-mar-24/uniao-pagara-remedio-nao-registrado-crianca-distrofia-muscular
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