Assim
que os olhos da madura Madame de Pompadour pousaram no jovem gravador da corte,
uma brusca paixão tomou conta da senhora e ele a fez sentir-se jovem outra vez.
Ao primeiro pedido apresentou-o ao rei e fez com que Dominique-Vivant Denon,
aos vinte um anos, fosse nomeado Cavaleiro e Intendente das Pedrarias Antigas
de Versailles. Este foi o primeiro degrau de uma fortuna que somente fez por
multiplicar-se toda a vida.
Mundano
culto e esperto, a seguir convenceu Pompadour apresentar-lhe seu amigo, o
intelectual mais famoso da época, justamente o grande Voltaire, com o qual
desenvolve amizade, e dele se tona hóspede por algum tempo; como recompensa
Denon o retrata no quadro “O almoço em Ferney”.
Vivant-Denon,
entretanto, sonhava mais alto. Aspirava à bela carreira diplomática. Pompadour
intervém outra vez por seu “queridinho” e o faz nomear secretário da embaixada
francesa na Rússia.Em Petersburgo, ele se apresenta à czarina Catarina,
trazendo no bolso interno da sobrecasaca uma carta de recomendações de
Voltaire.
Agora
será a vez da insaciável czarina se apaixonar pelo jovem francês e
facilitar-lhe a vida entre as jovens da corte; esperava casá-lo com uma jovem
aristocrata. Infelizmente o frio russo
incomoda Vivant até mesmo nas alcovas.
Dois anos após deixa a Rússia e decide ir à Holanda, onde se dedica a estudar
Rembrandt e, seguindo os traços do mestre, pinta “A adoração dos pastores”.
Retorna,
então, à França e obtém a secretaria da representação diplomática em Nápoles.
Serve de intermediário na venda de antigos vasos etruscos para o Rei Luís XV, o
que lhe rende uma fortuna em comissões e vendas fraudulentas. Parte deste
dinheiro negocia o apoio para sua entrada na Academia Real de Pintura Francesa.
Tempos
após é atraído por Florença e Veneza. Torna-se amante de Isabella Marine, dona
do salão de recepções mais em evidência na Europa. Acontece que justamente aí é
surpreendido pela Revolução Francesa! Atormenta-se com o fato da maioria de
seus bens e todas suas terras estarem na França!
Mesmo
enfrentando riscos decide-se pelo retorno. Ao chegar em Paris, vê que seu nome
fora incluído no rol dos trânsfugas da Pátria, tendo sido todos seus bens
confiscados ou sequestrados pela Revolução.
Desesperado,
o sofisticado Vivant-Denon vaga empobrecido pelas ruas de Paris, sobrevivendo
com desenhos e caricaturas, amando moças que em troca de seus afagos
ofertem-lhe um prato de batatas. Quantas vezes não viu passarem ao longe amigos
seus serem decapitados na Praça da Grève! Mas a sorte e a amizade das mulheres
não o abandonariam por muito tempo.
Casualmente
realiza o retrato de uma bela jovem revolucionária sem saber que ela era amiga
do “pintor oficial” da Revolução, o jacobino Jacques Louis David!
David,
homossexual passivo, toma-se de paixão por Denon, acolhe-o e sua arte e o
retira das ruas. Agora Vivant passa a desenhar as ousadas vestes de David, de
seus amigos e amigas, o que ocasiona uma
revolução de costumes para a época!
Graças
à sua insistência, David o apresentará a Robespierre e aos demais “os
incorruptíveis” da Revolução. O esperto Denon a todos se junta e obtém o que
parecia impossível: que lhe devolvam todos os bens confiscados! Novamente rico
e ao lado do Poder!
Naufragam
os jacobinos, o Terror chega a seu fim e Napoleão, com um Golpe de Estado,
faz-se nomear Consul. Vivant-Denon, que já se afastara de Babeuf e dos demais
derrotados, dedica-se a cuidar de sua fortuna e de suas propriedades. Seu amigo
David, que não soubera ser tão experto, escapara da guilhotina, mas ficara
preso.
Por
seu lado, Napoleão, em 1796, casa-se com Josefina de Beauharnais. Libertado da
prisão, o grande pintor David torna-se bonapartista ferrenho e introduz o amigo
Denon nas relações com o casal.
Dizem
os historiadores que Josefina só era “fria” com o próprio marido. Com Denon ela
era uma amante ardente. Foi iniciativa da esposa a indicação para que Denon se
juntasse ao grupo de 160 cientistas e artistas que tomariam parte na Campanha
do Egito que Bonaparte preparava.
Este
homem versátil, esperto, tão pouco ortodoxo em questões éticas e morais, jamais
entraria para a História, caso não ocorresse esta nova indicação de alcova.
Na
realidade, ele conquistou o Egito: munido a lápis, crayon, régua e esquadro,
preservou para a posteridade a imagem das mais magníficas criações do espírito
humano!
O
Egito, que Bonaparte e Denon encontraram, era mais velho que qualquer outra
cultura de que se tinha ciência na época. Para se tecer uma comparação, há
cinco mil anos, quando as culturas gregas e europeias deixaram seus primeiros
vestígios datáveis, o Egito possuía um desenvolvimento cultural admirável. Seus
tesouros estavam preservados pelo clima seco e quente, pelo respeito e
desinteresse dos chamados “mamelucos” pelos franceses. Ainda muito poucos
monumentos haviam sido tirados de seu solo para embelezarem Roma e residências
cardinalícias.
Denon,
quando pisou o Egito, ficou extasiado e a cada dia seu entusiasmo aumentava
frente às novas e prodigiosas ruínas com que se defrontava. Aos cincoenta e um
anos de idade, ele parecia um garoto, acompanhava todas as expedições de guerra
que pudessem lhe fornecer matéria-prima para seus instrumento de registro. Nem
o calor, nem o clima desértico o abalavam e, antes da aurora, já abandonava sua
cabana e punha-se a trabalhar até a noite!
De
repente, Denon se depara com os hieróglifos! Ele nada sabe sobre eles, jamais
ouvira falar. Em todo caso, copia-os rigorosamente. Cataloga-os com absoluta
precisão em três diferentes categorias, frutos de diferentes épocas.
Quando
as tropas aportam em Tebas (Luxor atual) ele mal se aguenta em si mesmo.
Comporta-se como um alucinado, tudo quer ver, tocar, registrar. Coloca,
mediante gorjetas, até mesmo soldados para que procurem novas peças.
Quando
a expedição de Bonaparte retirou-se do Egito, Denon trazia consigo, além de
objetos de grande valor, inumeráveis páginas rigorosamente catalogadas que, na
França, seriam ricamente impressas e encadernadas em quatro grandes volumes,
somente acessíveis aos ricos e guardadas como tesouro. Elas propiciaram
verdadeira fortuna para seu autor. “Descrição do Egito” foi o princípio de toda
Egiptologia.
Ao
voltar do Nilo, Denon era um homem próspero e respeitável. Foi nomeado pelo
agora Imperador Napoleão Bonaparte, Barão Diretor Geral de todos os museus
franceses.
Nas
guerras napoleônicas ele acompanhou o Corso em quase todas as jornadas. Em cada
cidade conquistada pelas tropas de Napoleão, Denon inspecionava as obras de
arte, principalmente as pinturas. Ele denominava “colecionar” as obras que
surripiava, as quais se somavam a seu enorme acervo pessoal, acervo este que
ocupava todo um palacete exclusivo às margens do Sena.
Em
1813, entretanto, não acompanhou Bonaparte à Rússia; tinha lá suas premonições
o proprietário de uma das maiores fortunas europeias. Permanecendo em Paris
escreveu um livro que alcançou extrema reputação pelo seu delicado erotismo:
“Ouvre Priapique”.
Entretanto,
antes mesmo da derrota de Napoleão na Rússia, somam-se os pedidos para que ele
devolva aos museus os bens roubados. Em 1815, com o desmoronamento napoleônico,
ele é desligado de suas funções estatais.
Desta
vez, ao contrário do que ocorrera na Revolução Francesa, Denon havia se
provisionado de uma enorme fortuna fora de França. Emigrou e sem demonstrar
interesse em viver sob a Restauração Absolutista. Anos após, Luiz XVIII oferece
ao fundador da Egiptologia, a manutenção do título de nobreza concedido por
Bonaparte, assim como a garantia de que todos os seus bens, caso retornasse, seriam respeitados.
Retorna
a Paris onde viveu até os 78 anos de idade, livre, bem relacionado com a
aristocracia dos Bourbons, rodeado de seus bens legais e ilegais, luxo e
rodeado por aquelas a quem mais amou na vida depois do dinheiro: as mulheres.
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