O
físico e membro do conselho editorial da Folha de S. Paulo, Rogério Cezar de
Cerqueira Leite, professor emérito da Unicamp, rebateu a tentativa do juiz
federal Sergio Moro, da Lava Jato, de censurar seus artigos. Cerqueira ocupa
espaço de leitores da Folha neste sábado (15) com uma nota na qual diz que Moro
se esquiva de responder sobre as acusações de que é "absolutamente
parcial".
"Respondo
aqui ao juiz Sergio Moro, embora ele não tenha se rebaixado a responder a um
simples plebeu, preferindo incitar Folha
a censurar meus artigos. Acusa-me o juiz de promover atos de violência. O fogo
a que me refiro é o fogo da história. Intelectos condicionados por princípios
de intolerância não percebem a diferença entre metáforas e ações concretas. O
juiz ainda se esquiva de responder à principal acusação que lhe faço, a de que
é absolutamente parcial e está a serviço das classes dominantes."
Em
nota à Folha, Moro escreveu: "Lamentável que um respeitado jornal como a
Folha conceda espaço para a publicação de artigo como o “Desvendando Moro”, e
mais ainda surpreendente que o autor do artigo seja membro do Conselho
Editorial da publicação. Sem qualquer base empírica, o autor desfila
estereótipos e rancor contra os trabalhos judiciais na assim denominada
Operação Lava Jato, realizando equiparações inapropriadas com fanático
religioso e chegando a sugerir atos de violência contra o ora magistrado. A
essa altura, salvo por cegueira ideológica, parece claro que o objeto dos
processos em curso consiste em crimes de corrupção e não de opinião. Embora
críticas a qualquer autoridade pública sejam bem-vindas e ainda que seja
importante manter um ambiente pluralista, a publicação de opiniões
panfletárias-partidárias e que veiculam somente preconceito e rancor, sem
qualquer base factual, deveriam ser evitadas, ainda mais por jornais com a
tradição e a história da Folha.
***
Abaixo, o artigo
“Desvendando Moro”, de autoria de Cerqueira Leite, publicado na Folha na
terça-feira (11/10):
Desvendando
Moro
“O
húngaro George Pólya, um matemático sensato, o que é uma raridade, nos sugere
ataques alternativos quando um problema parece ser insolúvel.
Um
deles consiste em buscar exemplos semelhantes paralelos de problemas já
resolvidos e usar suas soluções como primeira aproximação. Pois bem, a história
tem muitos exemplos de justiceiros messiânicos como o juiz Sergio Moro e seus
sequazes da Promotoria Pública.
Dentre
os exemplos se destaca o dominicano Girolamo Savonarola, representante tardio
do puritanismo medieval. É notável o fato de que Savonarola e Leonardo da Vinci
tenham nascido no mesmo ano. Morria a Idade Média estrebuchando e nascia
fulgurante o Renascimento.
Educado
por seu avô, empedernido moralista, o jovem Savonarola agiganta-se contra a
corrupção da aristocracia e da igreja. Para ele ter existido era absolutamente
necessário o campo fértil da corrupção que permeou o início do Renascimento.
Imaginem
só como Moro seria terrivelmente infeliz se não existisse corrupção para ser
combatida. Todavia existe uma diferença essencial, apesar das muitas
conformidades, entre o fanático dominicano e o juiz do Paraná -não há indícios
de parcialidade nos registros históricos da exuberante vida de Savonarola, como
aliás aponta o jovem Maquiavel, o mais fecundo pensador do Renascimento
italiano.
É
preciso, portanto, adicionar um outro componente à constituição da
personalidade de Moro -o sentimento aristocrático, isto é, a sensação,
inconsciente por vezes, de que se é superior ao resto da humanidade e de que
lhe é destinado um lugar de dominância sobre os demais, o que poderíamos chamar
de “síndrome do escolhido”.
Essa
convicção tem como consequência inexorável o postulado de que o plebeu que
chega a status sociais elevados é um usurpador. Lula é um usurpador e,
portanto, precisa ser caçado. O PT no poder está usurpando o legítimo poder da
aristocracia, ou melhor, do PSDB.
A
corrupção é quase que apenas um pretexto. Moro não percebe, em seu esquema
fanático, que a sua justiça não é muito mais que intolerância moralista. E que
por isso mesmo não tem como sobreviver, pois seus apoiadores do DEM e do PSDB
não o tolerarão após a neutralização da ameaça que representa o PT.
Savonarola,
após ter abalado o poder dos Médici em Florença, é atraído ardilosamente a Roma
pelo papa Alexandre 6º, o Borgia, corrupto e libertino, que se beneficiara com
o enfraquecimento da ameaçadora Florença.
Em
Roma, Savonarola foi queimado. Cuidado Moro, o destino dos moralistas fanáticos
é a fogueira. Só vai vosmecê sobreviver enquanto Lula e o PT estiverem vivos e
atuantes.
Ou
seja, enquanto você e seus promotores forem úteis para a elite política
brasileira, seja ela legitimamente aristocrática ou não”.
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