terça-feira, 23 de dezembro de 2008

A CONQUISTA. DO JOGO DE SEDUÇÃO ÀS VARAS DE FAMÍLIA

MEANDROS DA JUSTIÇA


Esporadicamente sou procurado para atuar em causas de competência das Varas de Família. Durante estes vinte e um anos, tenho observado atentamente o perfil das pessoas nelas envolvidas, chegando a algumas conclusões. É claro que não se trata de um trabalho científico, porém existem características comuns que marcam o início do jogo de sedução, momento em que qualquer um dos parceiros pode ser tanto caça quanto caçador, até o desembocar quase que inevitável nos trâmites de uma investigação de paternidade, separação, divórcio ou simples alimentos.

Tenho observado que o ser humano se utiliza de várias formas para conquistar seus parceiros. Porém, como não tenho a pretensão de elaborar um trabalho exaustivo, vou deter-me em duas táticas bastante utilizadas e que são justamente, o oposto uma da outra.

A primeira delas, é a conquista patrimonial ou material. Nela, a pessoa que tem poder aquisitivo, em primeiro lugar, envia um ramalhete de flores caríssimas à pessoa que será o alvo de sua investida, acompanhado de um convite para jantar. A mulher ou homem que a recebe, no momento em que aceita o convite, já sabe que, implicitamente ali está um convite para ir para a cama.
No horário marcado, encosta um carro, também caríssimo, com motorista particular ou dirigido pelo próprio conquistador que após pegar a “caça”, a leva para o melhor restaurante da redondeza.

Lá, o caçador pagará o melhor jantar e as melhores bebidas que o dinheiro pode pagar, impressionando assim a sua presa, tão somente pela força de suas posses.

Posteriormente, e isto é inevitável, caso não haja nenhum contratempo, tal como alguém beber demais, ser acometido de um mal súbito, ou de timidez, o casal irá a um motel com todos os apetrechos mais modernos para a prática do sexo.

No outro dia, a presa que já foi abatida e neste momento consta como um troféu na lista do caçador, receberá um telefonema com mais algumas flores, dizendo que foi a melhor noite da vida do caçador, coroando assim, a caçada levada a efeito nesta armadilha patrimonial.

O segundo tipo, é a conquista Intelectual ou poética. Aqui, a pessoa que não tem todo este patrimônio descrito acima, naturalmente, terá que ganhar os parceiros no talento. Talento que consiste em ter uma boa conversa, conhecer ao menos um pouco sobre todos os temas atuais, fazer poesia, música, saber tocar um instrumento musical, cantar, além de ter alguns conhecimentos de filosofia, tudo para impressionar através do intelecto a pessoa que ele pretende conquistar, embriagando-a com as suas idéias.

Deverá ser ágil nas respostas, criativo em todas as atitudes, saber transformar situações adversas em cenas cinematográficas, ter originalidade em todas as suas opiniões, enfim, criar uma aura imaterial que faça seu parceiro ou parceira, acreditar que a vida é bela, ainda que sem dinheiro.

O momento crucial, onde ele demonstrará toda a sua capacidade de oratória, é aquele em que deverá dizer que irão fazer sexo dentro do carro, em um hotel barato daqueles de terceira categoria ou até mesmo em um outro lugar mais exótico, já que em regra, ele não tem dinheiro para coisa melhor. Dependendo de sua capacidade, pode até pedir dinheiro emprestado para o motel. É neste momento que são separados os homens dos meninos, pois aqueles deverão transformar o local muitas vezes inusitado e insalubre, em um castelo medieval.

Em ambas, existem vantagens e desvantagens. Naturalmente, aquele que se utiliza das armadilhas patrimoniais, terá mais chances de obter um maior número de relacionamentos. No momento em que alguém tiver que fazer a opção entre ele e um caçador intelectual, será naturalmente o escolhido, já que funciona como uma espécie de terra firme, um porto seguro para os momentos de tempestade, e ninguém gosta de deixar o seu barco à deriva.

Ao contrário, aquele que usa a armadilha intelectual, também poderá conseguir muitos parceiros, porém, mais por encantamento, curiosidade ou pela própria embriaguez das idéias. Não terão tais relacionamentos o dom da perenidade, já que no outro dia o parceiro acordará do sonho e verá que na verdade colocou o seu barco em alto mar, estando assim, sujeito tanto a calmarias quanto a tempestades.

O problema é que o caçador que obteve sua caça através de uma armadilha patrimonial, terá maiores dificuldades para encerrar o jogo, eis que no momento em que tiver que partir, ela naturalmente quererá levar uma parte deste patrimônio na forma de pensão alimentícia para ela ou para um filho que geralmente costuma acontecer em tais relacionamentos, visto que eles acabam adquirindo um caráter de maior durabilidade.

Neste ponto, para o caçador intelectual não haverá maiores problemas, já que o talento, o intelecto, a originalidade e seus outros atributos, ninguém consegue tirar. No máximo, o alvo da caçada, conseguirá aprender algumas coisas que poderão ser utilizadas mais tarde em situações supervenientes. Para ele(a), o nascimento de um filho com um parceiro ou parceira somente ocorrerá por acidente ou por inexperiência, já que em casos tais, nunca se planeja uma gravidez.

Seja qual for a tática utilizada, a maior parte destes relacionamentos acabam indo parar nas Varas de Família. Lá, aquele primeiro tipo que expôs todo a sua capacidade financeira, sempre acaba tendo que pagar pensões mais vultosas, eis que não consegue ocultar os denominados “sinais exteriores de riqueza”.

Já o usuário da conquista intelectual, por não se conseguir provar sequer seus ganhos, os valores acabam sendo bastante irrisórios e, um eventual filho ou ex-parceiro irá lutar por muitos anos tentando cobrar as pensões que inevitavelmente irão atrasar. O devedor também irá sofrer, pois viverá durante todo este tempo na corda bamba, sempre tentando fugir ou justificar seus atrasos, numa tentativa desesperada de não ir para a prisão.

Alguém poderá dizer que eu estou sendo pessimista, tentando desfazer da instituição do casamento ou da união estável, desacreditando na existência de uma relação que acabe adquirindo uma certa estabilidade. É claro que eu apenas tomo conhecimento dos relacionamentos que acabam se deteriorando. Porém, a impressão que tenho é que estamos vivendo uma nova onda de hedonismo, com as pessoas querendo viver cada vez mais intensamente e não abrindo mão de uma parcela que seja do prazer. Noto que tão logo termina a atração sexual, por mais afinidade intelectual que os parceiros tenham, o relacionamento termina. Outro dia deparei-me com uma moça que dizia ter sido trocada por outra mais nova. Como eu, em contato com os seus documentos, já havia calculado que ela contava apenas com 22 anos, tive a curiosidade de perguntar-lhe que idade tinha a “outra”. Ela respondeu que a “dita cuja” (segundo suas próprias palavras) tinha apenas 16 anos.

Pois é. Vocês se lembram daquela frase que ouvíamos antigamente, de que “ele trocou uma de quarenta por outra de vinte anos”. Já está anacrônica. Hoje, estão trocando uma de vinte e dois por outra de dezesseis.

Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS

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